Artigos

Quando a falta de estratégia vira crise

strattegy marketing politico gestao de crise crises governo sp educacao falhaO governo de São Paulo anunciou em setembro um plano de reestruturação no ensino estadual com a intenção de criar escolas com apenas um ciclo de aprendizagem (1° ao 5° ano, 6° ao 9° ano ou ensino médio). A principal justificativa é a quantidade de vagas ociosas, uma vez que a rede pública paulista perdeu 2 milhões de alunos em 15 anos em razão da diminuição da taxa de natalidade, da municipalização do 1º ao 5º ano e da migração de alunos para a rede privada. Nos casos extremos há escolas com apenas 30% da ocupação. Manter classes vazias é desperdiçar recursos que poderiam ser mais bem empregados, na própria educação inclusive.

A separação dos alunos por idade é lógica desde o mobiliário. As necessidades de crianças de 7 anos, como parquinhos e ambientes lúdicos para o ensino, são diferentes das de jovens de 16 anos, que precisam de laboratórios e bibliotecas. No mundo ideal as opções não seriam excludentes, mas na vida real da administração pública é preciso fazer escolhas. Não há dinheiro para tudo. O ciclo único também diminuiria a necessidade de deslocamentos dos professores que lecionam em mais de uma escola para completar a carga horária, atrapalhando o rendimento e impedindo a dedicação na sua formação.

E apesar dos estudos técnicos que também indicavam melhor aproveitamento das escolas de ciclo único, o governo de São Paulo não planejou estrategicamente a reforma, acabando por transformá-la em uma grave crise. O Governo admitia a possibilidade de fechamento de 93 unidades, que continuariam a serem usadas como creches, centros de ensino técnico e de formação de professores. A despeito de afetar mais de 1 milhão de alunos, o anúncio do projeto ocorreu sem grandes esclarecimentos e com a intenção de implantá-lo já em 2016.

A falta de transparência sobre o destino dos prédios desocupados e dos recursos economizados gerou insegurança em pais e alunos, criaram dúvidas na opinião pública e deram margem para a instrumentalização política do debate. A ação foi operacionalizada por sindicatos e movimentos ligados a partidos políticos que trabalharam para inflar os protestos. A tensão explodiu em outubro, quando a polícia foi acionada, culminando em cenas de repressão que jogaram ainda mais gasolina em uma situação já inflamada. Os protestos tomaram as ruas, interromperam o trânsito e o entrevero gerou ainda mais pretexto para a radicalização. O resultado foi o descrédito do projeto e uma confusão que ultrapassou a comunidade escolar.

Mexer em direitos básicos tem grande peso num país que cobra pela melhoria da qualidade dos serviços públicos. Para a sociedade brasileira a educação é valor fundamental, portanto, é inaceitável o fechamento de escolas. Assim, uma decisão como essa não poderia ser tomada sem estratégia e a participação dos principais interessados.

Segundo o governo paulista, o aluno que fosse transferido iria para um colégio até 1,5 km da escola anterior e a transferência ocorreria por processo de preferência em que os pais indicariam, dentre as opções, as que fossem mais convenientes na próxima matrícula. O problema é que esta informação somente surgiu quando o tumulto já estava feito. A avaliação da conjuntura também foi equivocada. A medida foi anunciada meses após o término de uma das maiores greves de professores do Estado, que reivindicava melhorias salariais que não foram atendidas. Não sendo, dessa forma, o melhor momento para a apresentação da proposta.

Essa história mostra um erro recorrente na gestão pública, mesmo no Estado mais rico do país. Faltou planejamento e comunicação por parte do Governo. Questões de grande importância, e conseqüente repercussão, só se efetivam se houver apoio dos grupos de interesse envolvidos. A mudança precisa ser preparada para obter consensos mínimos. Devidamente apresentada e discutida, antes de sua implementação, neutralizaria uma possível rejeição.

O fato de uma questão de cunho educacional ter se tornado caso de polícia levou à queda do Secretário de Educação e fez a popularidade do governador Geraldo Alckmin atingir sua pior marca, segundo pesquisa divulgada no início de dezembro, no mesmo dia que o governo anunciou a suspensão da reforma.

Por Leandro Grôppo

COMPARTILHE
WhatsApp
Telegram
Twitter
Facebook
LinkedIn
Email