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Pesquisa ou Propaganda?

Mais uma eleição e de novo as pesquisas são colocadas à prova. Contudo, um aspecto que foi muito usado esse ano está passando à margem do debate. A medição da capacidade de transferência de votos de um político a outro, é comum e bastante utilizada internamente nas campanhas. Na eleição de 2022, porém, o apadrinhamento passou a ser propagandeado como se determinasse o resultado final. Erro tão claro como o objetivo por trás da divulgação.

Manchetes do tipo “Fulano com apoio do Cicrano vence a eleição” estamparam noticiários. Mesmo o “Fulano” tendo 20, 30 pontos percentuais abaixo do primeiro lugar na intenção de votos e nada indicar que esse dado sozinho reverteria o cenário ou, portanto, iria se concretizar.

O resultado de uma eleição não é definido por somente um fator. São ao menos quatro os elementos preditivos de voto: conjuntura, imagem, recursos e comunicação. O apoio de um candidato a presidente para um a governador pode ser relevante na conjuntura e imagem, influenciando os recursos e a comunicação. Porém, não deve ser lido como único nem definitivo.

Exemplos, para os dois lados, foram muitos e espalhados pelo Brasil. No Nordeste, onde Lula tem grande força, a capacidade de agregação de imagem possibilitou que a conjuntura de continuidade permitisse uma virada na Bahia, para surpresa de alguns. O oposicionista ACM Neto liderou as intenções de votos com folga grande parte da campanha, sendo ultrapassado pelo candidato Jerônimo Rodrigues na última semana. No Ceará, o candidato governista Elmano Freitas iniciou a campanha há menos de três meses da eleição, enfrentou o candidato de Ciro Gomes e venceu no primeiro turno. Os dois resultados são fruto exclusivo do forte apoio de Lula? Não.

Tanto no Ceará quanto na Bahia, os governos que se encerram são bem avaliados, os governadores em fim de mandato possuem imagem positiva, com marcas e entregas relevantes. Aliado a isso, em ambos casos, as campanhas de oposição cometeram erros, possibilitando a reviravolta que, portanto, vai muito além do apadrinhamento Lulista.

Caso semelhante, com resultado invertido, aconteceu em Minas Gerais, segundo colégio eleitoral mais importante do país. Com uma gestão bem avaliada e o governador aprovado pela maioria dos mineiros, coube ao principal candidato adversário a tentativa de se escorar no padrinho da ocasião. Pesquisas que indicavam que “com apoio de Lula o Fulano vencia” foram propagandeadas desde bem antes do período eleitoral. Mesmo com gritante desvantagem na intenção de voto, as manchetes continuavam tentando impor a narrativa como se a profecia fosse autorrealizadora.

Depois de um mês de campanha e o bombardeio da comunicação que ressaltava mais o apadrinhamento do que propostas, veículos de comunicação associados ainda faziam circular que o Fulano venceria “quando apoiado pelo Lula“. Ora, se o apoio real até aquele momento não se revertia em votos ao apadrinhado, porque a insistência da divulgação do dado?

Nada é tão traiçoeiro quanto aquilo que é evidente. O dito popular pode ser usado também quando o assunto é pesquisa de opinião. Um dos riscos, como disse o célebre publicitário David Ogilvy, é a pesquisa ser usada como bengala e não como iluminação. Ou seja, enxergar só o que está a favor, seja do seu candidato, da sua tese ou do argumento que considera mais correto.

Empresas de pesquisa que se prezam ao papel de propagandistas prejudicam especialmente os institutos sérios, inclusive os que sequer divulgam resultados. A vida de alguns políticos seria mais fácil se entendessem que não devem subestimar a inteligência dos eleitores. Afinal são eles que decidem e não as pesquisas, muito menos os jornais.

Por Leandro Grôppo

Jornal da USP Imagens, Tammaro
Fotomontagem de Freepik e TSE
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