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A cebola das pesquisas

Em pesquisa de opinião sobre política, dois mais dois nem sempre somam quatro. Porque além do que se vê, é preciso interpretar o que as pessoas sentem. Emoções que impactam as decisões diárias e portanto, o voto. Pois a sociedade de um país, a população de um Estado ou os eleitores de uma cidade não são massas que atuam da mesma forma. As pessoas têm reações e julgamentos diferentes diante de percepções que se tornam a própria realidade. Por essa razão a tarefa de compreender é complexa porque as pessoas, em si, também o são.

Assim, pesquisas de diagnóstico devem aprofundar a realidade, não somente descrevê-la. Entender como as emoções são geradas, transmitidas e internalizadas, demandam análises que vão além dos números. Pois as respostas muitas vezes não são como se mostram ser através dos seus significantes, quer dizer, do que é dito. Mas sim, o que as pessoas percebem e sentem que são, ou seja, seu verdadeiro significado. Que têm diferentes sentidos para cada um. Se mudam as referências, mudam-se os significados. E o que até ontem era aceito, hoje pode ser repudiado. Daí surgem novas necessidades, oportunidades e exigências.

O “diagrama da cebola”, desenvolvido por Sebastião Bicalho (1998), tem muito a ver com a identificação das escolhas comportamentais do filósofo alemão Schopenhauer (1844). Uma de suas máximas estabelece determinações que regem as condutas das pessoas interna e externamente. Extrapolando o modelo, a aversão a um político pode nem sempre corresponder diretamente a essa emoção, mas sim encobrir uma tristeza, por exemplo. Psicologia que quando aplicada deixa de ser básica e vale também para distinguir demandas reais das aparentes do eleitorado.

Por exemplo, na eleição presidencial de 2022, parcela significativa dos brasileiros se mostrou cansada da polarização extrema e seus discursos. Pesquisas demonstravam que cerca de um quarto do eleitorado não queria nem Lula e nem Bolsonaro presidente. Mas qual era o contexto por trás do número? Apesar do desejo de “nem um nem outro”, a rejeição, contra um e contra outro, era maior que o significado ofertado pelos demais candidatos. Resultado: o terceiro colocado no primeiro turno teve apenas 4% dos votos. “Parecia” que muitos queriam a quebra da polarização, porém, 92% dos eleitores que foram votar escolheram um dos dois principais candidatos.

As experiências traumáticas da pandemia deixaram um ceticismo sobre Bolsonaro que decepcionou uma parte de seu eleitorado, que também já tinha sido decepcionada por Lula anteriormente, mas que ao final mantiveram-se na polarização pelo sentimento de rejeição a um dos lados ser maior que a demanda por alguém “novo”. Quando o dado quantitativo de quem não queria ambos era confrontado com a questão adicional de quem o eleitor não gostaria que vencesse, comprova o entendimento qualitativo de que não havia espaço suficiente para uma terceira via na disputa.

Na maioria das vezes, o que as pessoas opinam é apenas a primeira camada da cebola. Para reconhecer as realidades é preciso aprofundar a opinião pra saber o que sentem, desejam e rejeitam. Pois nem toda verdade está posta somente na palavra dita. As emoções, como as capas da cebola, cobrem o núcleo do pensamento que define as decisões. É preciso fazer as perguntas certas para descascá-la e chegar ao seu coração. O que para alguns serve como tempero, para outros pode até fazer chorar. 

Por Leandro Grôppo

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